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Daqui a pouco, mais precisamente às 16 horas pelo horário de Brasília, passará ao vivo para todo o Brasil, através de dois canais de televisão, o confronto válido pelas semi-finais da Champions League entre as atuais potências Barcelona e Bayern de Munique, bases da Seleções Espanhola e Alemã, respectivamente, e times que polarizaram a atenção mundial pela qualidade do futebol mostrado nos últimos anos.

Qualidade essa inquestionável, diga-se de passagem.

A transmissão dessa fase da Champions aqui em Terras Brasilis já não é mais novidade. Se antes esse confronto ficava restrito apenas aos canais fechados especializados em esporte, de um tempo pra cá, não só essa fase do torneio, mas o campeonato em si tem sido transmitido na TV aberta do país, com as devidas reportagens antes e pós jogos, além da insistente promoção da transmissão.

Efeitos do mundo globalizado. Será?

Da mesma forma que se tornou comum ver esses jogos, do principal torneio de clubes da Europa, também se tornou comum ver camisas desses times circulando nos mais diversos locais e cidades do país. Camisas do Barça, do Real e do Milan são as mais comuns, mas também é possível acharmos camisas de times que nem sabíamos que existiam. 

Se você for a algum condomínio de classe C e B em São Paulo, por exemplo, talvez se assuste com uma constatação: as camisas de times Europeus já são mais comuns nos corpos de meninos com menos de 15 anos, do que a de times brasileiros.

Da mesma forma vem acontecendo com as Seleções. Uma vez, ao ver um colega com um casado da Espanha, questionei a ele por que ele usava aquele casaco ao invés de utilizar um da Seleção Brasileira. A resposta veio de bate-pronto: “Porque eles são a melhor Seleção do mundo!”.

Nem o argumento de quê a Seleção Brasileira detém 5 vezes mais títulos mundiais que a Espanhola não foi suficiente para fazê-lo perceber a besteira que tinha dito. A Seleção Espanhola pode ser a que joga o melhor futebol hoje, mas não é a melhor do mundo! Eles têm que comer muito arroz com feijão para alcançar esse feito! Muito…

Mas não alonguei o assunto, até porquê cada um veste aquilo que quer, e ele não tem culpa de pensar o que pensa.

A culpa é dos dirigentes do nosso futebol.

A internacionalização de nossa torcida vem acontecendo de forma gradual e paulatina nos últimos 15 a 20 anos. 

Ainda não chega ao estágio de roubar torcedores dos times nacionais, certamente que não. Mas é um fenômeno que deveria ser analisado com mais intensidade pelos dirigentes de clubes e federações do país. 

Hoje para um Corinthians, um Flamengo, um Grêmio ou um Sport Recife isso pode não fazer tanto efeito, até porque nossos dirigentes já estão acostumados com a “esmola” que seus clubes conseguem arrecadar. 

Mas, à partir do momento que um garoto de 12 anos prefere comprar uma camisa do Real Madrid, um jogo de vídeo-game que tenha a Liga Inglesa, ou assistir uma semi-final de Champions ao invés de comprar uma camisa do São Paulo, de exigir um jogo de vídeo-game com times do seu país, ou de assistir uma semi-final da Libertadores, podemos começar a perceber que os hábitos de consumo relacionado ao futebol desse garoto, quando homem, poderão ser mantidos ou ampliados, como acontece com qualquer torcedor e consumidor do mundo.

Perceber que essa garotada de hoje está tendo muito mais afinidade com o que vem de fora e, além disso, agir contra essa situação, deveria ser prioridade zero para os dirigentes de nosso futebol. 

A perda de receita que já está acontecendo, quando um garoto pede ao pai uma camisa do Manchester no lugar de uma do Flamengo, deveria preocupar e muito aqueles que querem um futebol brasileiro cada vez mais fortalecido.

Sem falar na nossa Seleção que, como já disse aqui em outras oportunidades, está completamente sem identificação com nosso torcedor. Esperem e verão, já na Copa das Confederações, uma torcida com pouca afinidade com seus atletas, com sua Seleção.

Não quero nem ver como vai ser na Copa do Mundo.

Deter e diminuir os efeitos desse processo é possível. Para isso, o primeiro passo seria os dirigentes do nosso futebol entenderem que o maior rival de seu clube não é o adversário em campo, mas todas as outras opções de lazer que podem roubar a atenção dos torcedores, e consequentemente seu dinheiro.

Como diz o Erich Beting, o maior rival do Corinthians não é o Palmeiras. É o cinema!

Eu incluiria, se o Beting me permitisse, a constante internacionalização da torcida brasileira nesse rol de rivais.

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Eu já disse aqui, ou no endereço antigo do blog, que o único legado que a Copa do Mundo de 2014 vai deixar para o país é um pouco mais de 15 estádios modernos, novos e em condições de abrigar o público com todo conforto e segurança. Alguns desses estádios serão, sem dúvida nenhuma, grandes elefantes brancos. Mas outros não.

E, na esteira da nova onda de estádios brasileiros, três clubes que não tiveram seus estádios escolhidos para a Copa de 2014 também terão estádios novos (ou renovados). O São Paulo que aprovou a instalação da cobertura no estádio do Morumbi, e além disso o projeto consiste também em dedicar uma área do estádio para shows de médio porte. O Palmeiras que praticamente pôs abaixo seu antigo Parque Antártica e está construindo no local um novo estádio, muito bonito por sinal, e o Grêmio que construiu sua nova arena em local diferente do antigo estádio Olímpico (que será demolido).

Dos três, apenas esse último já está pronto e em uso. Sua inauguração foi em um jogo amistoso no final do ano passado e o estádio recebeu nessa última quarta-feira seu primeiro jogo oficial.

Nem preciso narrar aqui, com dois dias de atraso, o que ocorreu no estádio gaúcho.

O que é preciso refletir, e isso parece que o presidente do clube gaúcho e sua torcida ainda não fizeram, é que um estádio novo não comporta mais esse tipo de atitude, esse tipo de situação. Ou não poderia comportar.

O Grêmio erra em manter um espaço dedicado aos vândalos em seu estádio. Erra ao permitir que um investimento daquele porte, que trás ao torcedor comum uma sensação de estar sendo bem tratado, querido, ainda abrigue os mesmos que destroem seu patrimônio, afastam investimentos e causam sérios riscos à integridade física deles e dos outros.

E lembremos que nos dois jogos na nova arena houve esse tipo de problema. No primeiro, por sinal um simples amistoso comemorativo de abertura do estádio, teve um quebra-quebra no mesmo setor.

O legado que um estádio moderno pode trazer para o futebol não é apenas a beleza das novas construções, mas sim uma mudança de comportamento dos clubes com relação aos seus torcedores, passando a tratá-los com o respeito e a dignidade que qualquer empresa do setor de entretenimento dá aos seus consumidores, e não como um bando de qualquer coisa ou um rebanho de bezerros.

Seja na Arena Grêmio, seja no Mineirão (que receberá um clássico já no seu jogo de abertura), seja na Fonte Nova ou lá em Itaquera, essas novas e modernas arenas multi-uso sugerem um novo tratamento àqueles que ocuparão suas cadeiras, seus camarotes. Se eu compro um ingresso para um estádio desses, quero chegar com conforto, entrar sem empurra-empurra, comer e ir ao banheiro sem perder meu lugar (reservado) e, principalmente, ter ao menos uma pequena sensação de que chegarei bem em minha casa.

Chega de espaços reservados para torcidas organizadas, chega de permitir que os vândalos que sempre agem brutalmente frequentem mais nossos estádios (velhos ou novos), chega de dar abrigo para aqueles que um dia ou outro, certamente, irão destruir o patrimônio dos clubes.

Enquanto mantivermos a mentalidade antiga, os estádios novos serão apenas bonitos por fora, para se tirar fotos de helicóptero e fazer cartões-postais. Mais nada. E, com episódios como o dessa última quarta-feira ocorrendo constantemente, essas novas arenas se tornarão os velhos estádios em pouco tempo.

E aí, o único legado que a Copa do Mundo poderia ter deixado, será destruído por nossa ignorância.

A foto desse post é de Lucas Uebel / Uol Esporte.